08 novembro 2009

Fundação Calouste Gulbenkian


O Ministério da Cultura que Portugal não tinha


«Pelo presente testamento é criada, nos termos da lei portuguesa, uma Fundação, que deverá denominar-se «Fundação Calouste Gulbenkian». As bases essenciais dessa Fundação são as seguintes:

a. é portuguesa, perpétua, a sua sede e em Lisboa, podendo ter, em qualquer lugar do mundo civilizado, as dependências que forem julgadas necessárias;

b. os seus fins são de caridade, artísticos, educativos e científicos;


c. a sua acção exercer-se-á, não só em Portugal, mas também em qualquer outro país onde os seus dirigentes o julguem conveniente;


d. será dirigida e administrada pelos «trustees» adiante designados e por outras pessoas por eles escolhidas ou como for estabelecido nos respectivos estatutos;


e. logo após a morte do testador, na hipótese de ele o não haver feito antes, os executores testamentários e «trustees» redigirão, e farão aprovar superiormente, os estatutos da mencionada Fundação, e praticarão todos os actos necessários, quer a legislação da Fundação criada por este testamento, ou a sua criação, caso se entenda que só pela aprovação dos estatutos ela pode considerar-se criada, quer à sua instalação e funcionamento. (...)
»
Extracto do testamento de Calouste Gulbenkian onde se refere á Fundação



«A Fundação Calouste Gulbenkian é uma instituição portuguesa de direito privado e utilidade pública, cujos fins estatutários são a Arte, a Beneficência, a Ciência e a Educação. Criada por disposição testamentária de Calouste Sarkis Gulbenkian, os seus estatutos foram aprovados pelo Estado Português a 18 de Julho de 1956.»

Calouste Sarkis Gulbenkian


«Em Abril de 1942, em plena II Guerra Mundial, Calouste Gulbenkian encontrava-se em França, mas em Vichy integrado na delegação diplomática Persa. A sua participação na Iraq Petroleum Company tinha sido temporariamente confiscada pelos britânicos uma vez que, como residente num país ocupado, Calouste era considerado tecnicamente “um inimigo” de acordo com a lei. Apesar do facto de se tratar tecnicamente de uma decisão legal e que depois da guerra a sua concessão lhe foi devolvida com indemnização, a atitude do seu país adoptado continuou a causar-lhe incómodo porque suspeitava que o Governo Britânico estava a ajudar os seus sócios a retirar-lhe os 5%. Decide então emigrar para os Estados Unidos da América. Como primeira etapa, a convite do embaixador de Portugal em França, Calouste deslocou-se a Lisboa para uma pequena paragem de repouso antes de prosseguir viagem para Nova Iorque. A pacatez social de Lisboa, o sistema fiscal que encontrou, e a não interferência dos media terão provavelmente pesado na sua decisão.


Em Lisboa sente-se bem acolhido - escreverá, depois, "que nunca havia sentido em mais lado nenhum" uma hospitalidade como a que o rodeou em Lisboa, uma cidade tranquila numa Europa devastada pela guerra.

O Hotel Aviz, em Lisboa, foi a sua casa durante 13 anos. Calouste Gulbenkian deixou em testamento (18.06.1953) importantes legados aos seus filhos, estabeleceu pensões vitalícias em favor de outros familiares e colaboradores de longa data. No seu testamento estabeleceu a constituição de uma fundação internacional, com o seu nome, que foi a herdeira do remanescente da sua fortuna, com sede em Lisboa, presidida pelo seu advogado de confiança, Lord Radcliffe. A este confiou a missão de agir em benefício de toda a “humanidade”. Esta fundação deveria reflectir o que considerava as suas maiores proezas: a sua colecção de obras de arte e o seu papel como “arquitecto de empreendimentos”, concebendo estruturas para englobar e reunir diferentes nações, grupos e interesses. A colecção de obras de arte logrou ficar exposta num museu especialmente construído para esse efeito, na sede da Fundação, o Museu Calouste Gulbenkian, mas divergências quanto ao peso da actividade internacional da Fundação e à composição do seu Conselho de Administração, designadamente a maioria de membros de nacionalidade portuguesa e o receio da interferência do Governo, conduzem Lord Radcliffe a renunciar, sendo a presidência da Fundação assumida por José de Azeredo Perdigão. A Fundação Calouste Gulbenkian é uma das doze maiores fundações do mundo.

Morreu em Lisboa, a 20 de Julho de 1955, com 86 anos.»


DN
Até 1942, Gulbenkian está em Vichy. O que o faz vir para Portugal?

Gulbenkian tinha um filho, Nubar, e uma filha, Rita. Nubar visitou várias vezes Portugal e conheceu o Aviz, hotel encantador. Descreveu Portugal ao pai como uma terra muito tranquila, onde não havia guerra e onde se pagavam poucos impostos. Gulbenkian sentiu-se atraído e instalou-se até à morte no Aviz.

Em Portugal, Gulbenkian teve uma boa relação com Oliveira Salazar?

Achava que Salazar era um grande homem porque tinha mantido o País em paz. E sabe-se que Salazar ficou tão feliz com a Fundação que até dizia sobre Azeredo Perdigão "Pode ser de esquerda, mas é um patriota."

O advogado Azeredo Perdigão foi decisivo para a Fundação ficar em Portugal?

Foi muito hábil. Era muito inteligente e compreendeu que Gulben-kian tinha uma maneira de se comportar que apreendeu muito bem. Que gostava de dizer às pessoas qualquer coisa que desejaria fazer e desejava encontrar nas pessoas razões para as fazer. E foi isso que cimentou uma grande amizade.


José de Azeredo Perdigão


«José de Azeredo Perdigão era um homem determinado - e que sabia ouvir as pessoas. Sem a sua habilidade negocial, a cultura em Portugal seria bem diferente. Soube transformar o testamento de Calouste Gulbenkian numa instituição que é um farol do saber. Azeredo Perdigão percebeu a importância da “realização da Fundação”, salienta o arquitecto Gonçalo Ribeiro Telles. A sua visão fomentou uma geração inteira de artistas.

Em 1942 foi apresentado a Calouste Gulbenkian, filantropo e milionário de origem arménia, que escolheu Portugal como refúgio durante a II Guerra Mundial. José de Azeredo Perdigão impressionou Gulbenkian, homem exigente e rigoroso. Foi contratado como assessor jurídico, com a tarefa de tratar de assuntos relativos às transferências de fundos, assuntos fiscais e contratos da aquisição de obras de arte.

Em 1948 Gulbenkian decidiu elaborar o seu testamento. Havia que dar rumo à sua fabulosa colecção de arte. A confiança que depositava em Azeredo Perdigão levou-o a partilhar os planos da criação de uma fundação que serviria para albergar o seu espólio artístico. A capacidade de Perdigão para ouvir as pessoas foi fundamental para esta base de confiança. Gulbenkian não gostava de ser contrariado pelos seus colaboradores. Portugal como sede da futura fundação era uma hipótese que ganhava consistência. Azeredo Perdigão começou a negociar com o governo português as condições mais favoráveis.

Calouste Gulbenkian morreu em 1955, e a sua morte marcou o início de uma luta entre Azeredo Perdigão e Cyril Radcliff, advogado inglês do magnata. O que estava em jogo era a nacionalidade da Fundação. A batalha terminou com a aprovação dos estatutos da Fundação Gulbenkian em 18 de Julho de 1956. Azeredo Perdigão ganhou em toda a linha. O passo seguinte foi convencer Salazar a não interferir na vida interna da instituição. A tarefa não foi difícil. Apesar de Salazar não gostar das opiniões políticas do advogado, estava convencido de que era um patriota.

José de Azeredo Perdigão foi nomeado presidente da Gulbenkian, cargo que desempenhou durante cerca de 40 anos. Implementou programas de atribuição de bolsas de estudo e de subsídios à criação artística, criou a Orquestra Gulbenkian e as bibliotecas itinerantes, que levaram a literatura a todos os pontos do País. O primeiro centro de arte moderna do País foi construído pela Gulbenkian. Hoje tem o nome de José de Azeredo Perdigão.

O legado deste homem é muito importante. Deu a Portugal uma instituição ao nível de qualquer outra relevante em Londres, Nova Iorque ou Paris. Como diz Gonçalo Ribeiro Telles, José de Azeredo Perdigão “foi uma grande figura para o desenvolvimento cultural do País”.»


Bibliografia:

DN-(entrevista) Pedro Saraiva,Leonídio Paulo Ferreira 20 Julho 2005


Fundação Calouste Gulbenkian

RTP - Os Grandes Portugueses

Um comentário:

Anne A. Corrêa-Guedes disse...

Quem foi entrevistado pelo DN ?